Primeiro que tudo, poderias dar-nos uma curta definição do que é a Terapia Ocupacional?
Bem, eu (e certamente todos os alunos e terapeutas ocupacionais) temos o trabalho arduo de explicar o que é a nossa profissão de uma forma simples e interessante, sendo ela extremamente complexa, mas vou tentar responder...
o terapeuta ocupacional trabalha com pessoas com problemas no desempenho e na participação ocupacional, isto é, com todas aquelas pessoas que, por algum motivo (doenças, incapacidade, alterações no ambiente, mudanças culturais, etc etc)
não consigam ou tenham dificuldade em realizar aquilo que desejam ou é necessário fazerem (ex. tomar banho, vestir, trabalhar, comer, ir às compras.. todo o tipo de ocupações).
Em que casos se aplica? Quais os seus objetivos?
Uma vez que qualquer pessoa pode ter dificuldades em realizar o que deseja ou deve fazer, t
rabalhamos com todas as faixas etárias desde recém-nascidos a idosos. O nosso objetivo final é que a pessoa seja o
mais autónoma e independente, tanto quanto lhe for possível, e dessa forma
promover o seu bem-estar e qualidade de vida. É importante referir que também trabalhamos com o intuito de prevenir a disfunção ocupacional (exemplo,
promover um envelhecimento saudável).
O que te fez escolher esta profissão?
Quando andava a descobrir "o que queria ser quando fosse grande" tinha uma ideia fixa na cabeça:
queria ajudar, queria fazer a diferença e queria ter um contacto directo com as pessoas de modo a sentir que fazia mesmo a diferença, de uma forma concreta e direta. Por isso escolhi a área da saúde e depressa dei por mim a pesquisar cursos de reabilitação.
Primeiro pensei na fisioterapia e na terapia da fala, até porque não fazia ideia que terapia ocupacional existia... através das pesquisas sobre fisio e TF, lá descobri TO e procurei saber mais sobre essa profissão, visitei a minha faculdade no secundário, falei com estudantes e achei que a TO era um mundo vasto e extremamente interessante, que me fazia muito mais sentido do que fisio e TF. Senti que era compatível com T.O. Ainda assim confesso que só descobri o que era Terapia Ocupacional na totalidade quando ingressei no curso (alias eu sou da opinião que essa é a única forma de compreender totalmente a TO). foi aí que descobri que era o meu sonho e que tinha feito a escolha certa.
Quais dirias que são os pontos fortes, e também o lado menos bom, de ser Terapeuta Ocupacional?
Como a minha professora de bioética diz
"somos dos profissionais de saúde mais humanos que existem", muito da nossa filosofia da prática implica perceber a pessoa como um ser holístico e não apenas como uma pessoa composta por diversas partes, em que uma delas pode estar "avariada".
Precisamos de compreender a pessoa na sua totalidade para planearmos a nossa intervenção e escolhermos o "caminho" mais adequado, pois cada pessoa é única, e o seu diagnóstico dá-nos apenas uma pequena (pequeníssima na minha opinião) informação sobre a pessoa.
Preocupamo-nos com a pessoa e não com o seu diagnóstico. O lado menos bom: o facto de ser
uma profissão desconhecida por muitos, até por profissionais de saúde, retira-nos algum reconhecimento do nosso trabalho e daquilo que somos capazes de fazer pela pessoa.
Consegues resumir-nos o que seria um dia na vida de um Terapeuta Ocupacional? (que actividades realizas num dia de trabalho? Com quantos pacientes trabalhas? Há outros profissionais envolvidos no processo?)
Resumir um dia na TO? isso é muuuuuuuuiiiito complicado. Depende da área em que estás, do local onde trabalhas, das condições... Posso se calhar é falar do local onde estou a estagiar atualmente... Estou a estagiar com idosos, e a
s sessões de TO são todas realizadas em grupo, uns grupos maiores que outros, mas na teoria
o máximo deviam ser 8 utentes, na prática, quando fazemos sessões de movimento já chegamos a ter 25 utentes. de uma maneira geral (sem contar com as tais sessões de movimento) são 10 utentes por sessão. O nosso objetivo é promover a participação ocupacional e estimular/promover/melhorar desempenhos. R
ecorremos sempre a ocupações para que os utentes possam 'exercitar' competências (motoras, de processamento e de comunicação e interação), de modo a melhorar os seus desempenhos ocupacionais. Como exemplo temos a
Wiiterapia: utilizamos jogos da wii para estimular capacidades como: amplitude de movimento, coordenação, equilibrio, competencias de processo: têm que compreender as regras do jogo, identificar problemas e resolve-los.. manter a atenção e concentração etc, entre outras. No fundo a nossa filosofia é utilizar atividades que tenham significado para a pessoa e que ao mesmo tempo sejam terapêuticas. Quanto aos restantes profissionais, de uma maneira geral (e já não estou a falar do meu local de estagio)
os TOs podem trabalhar em equipa com Fisios, TF, psicologos, psiquiatras, animadores socioculturais, arquitetos e engenheiros (quando fazemos alterações no ambiente, seja numa rua, seja na casa da pessoa para que ela seja autonoma), professores, professores de ensino especial, assistentes sociais... etc.
Sentes que a opinião da população geral em relação à Terapia Ocupacional é positiva, negativa ou indiferente? As pessoas acreditam no papel desta terapia?
Pode variar,
quem não conhece tem duvidas sobre a sua eficiencia e eficácia, quem trabalha com TOs competentes reconhece o nosso potencial e valoriza-nos muito por isso. Em muitos locais de estágio os terapeutas ocupacionais são chefes de equipas multidisciplinares e penso que isso só acontece porque as pessoas reconhecem que esta é uma terapia que pode realmente mudar a vida das pessoas. Quanto aos utentes/clientes, ao principio penso que ficam sempre desconfiados, podem até
achar que parece tudo uma brincadeira, mas depois vão percebendo o objetivo das atividades,
vão sentindo que a terapia provoca mudanças positivas no seu dia-a-dia, e no final do processo de reabilitação geralmente o sentimento é de gratidão.
Para terminar, há alguma coisa que já tenhas vivido como Terapeuta Ocupacional que te tenha ficado marcada de alguma maneira especial?
A
felicidade das pessoas quando os seus objetivos de reabilitação são alcançados, é indescritível, é mesmo mágico, acho que nesses momentos
sentimo-nos como super heróis. Numa perspectiva negativa: a forma como a medicação pode alterar uma pessoa, neste estágio já tive diversas experiencias em que a
medicação de um utente é alterada e parece que a pessoa "perde-se", deixa de ser, deixa de viver para apenas existir...
Joana Emauz Madruga,
Finalista de Terapia Ocupacional em Alcoitão
(and a great friend of mine, thanks for your time)
Espero que com esta entrevista, tenham ficado a perceber um pouco melhor esta profissão, e além disso tenha conseguido o meu objetivo: demonstrar que não são só médicos e enfermeiros os únicos que contactam com os pacientes e que os podem ajudar!